Marco Legal dos Seguros no centro das atenções

Dois primeiros painéis do 16º Seminário da ABGR debateram a operacionalidade dos grandes riscos diante da Lei 15.040/2024 e

perspectivas do mercado segurador neste cenário

Por Tany Souza

Ao reunir risk managers e profissionais do setor de diversas regiões do Brasil, a 16ª edição do Seminário de Gestão de Riscos e Seguros – Expo ABGR 2025 superou todas as expectativas. O evento ocorreu nos dias 12 e 13 de agosto, no WTC Events Center, em São Paulo, e reafirmou seu título de maior evento de gerenciamento de riscos da América Latina. Mais de 3 mil participantes — entre grandes players do mercado e tomadores de decisão em risk management — estiveram presentes, fortalecendo o networking e promovendo debates de alto nível.

Com o tema “O Gerenciamento de Riscos nas Organizações e o Marco Legal do Mercado de Seguros”, o evento contou com três painéis simultâneos, somando 24 painéis temáticos. Especialistas de diversas áreas discutiram temas como operacionalidade dos grandes riscos, riscos climáticos, D&O, agronegócio, ESG, entre outros.

A primeira plenária abordou “O Marco Legal dos Seguros: Lei 15.040/24 e a Operacionalidade dos Grandes Riscos”, com a participação do doutor em Direito pela USP-SP, presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS) e coautor do anteprojeto de Lei de Contrato de Seguro, Ernesto Tzirulnik; do vice-presidente da Federação Nacional de Seguros Privados (Fenseg) e CEO da Mapfre Brasil, Felipe Nascimento; do CEO do IRB(Re), Marcos Falcão; e, como moderador, Christian Mendonça, head de Riscos e Seguros da Norsk Hydro para a América do Sul e vice-presidente do Conselho da ABGR.

Felipe Nascimento abriu sua fala destacando que a nova Lei é um marco para o setor de seguros, embora traga questionamentos. “Como toda mudança dessa magnitude, ela não está isenta de discussão ou polêmica, mas posso testemunhar que foi tratada de forma absolutamente transparente e democrática.”

Ele ressaltou que a lei foi amplamente debatida com diversas instituições. “Houve participação de várias entidades, com destaque para a CNseg, que nos representa como seguradores, mas não se limitou a ela. Eu, representando a Mapfre, pude me reunir com Ernesto e outros mentores intelectuais da Lei para discutir pontos que nos preocupavam. Foi uma troca muito interessante. Hoje, temos um novo marco que vejo com otimismo.”

Nascimento completou: “Apoiamos a nova Lei de Seguro desde sua concepção, pelos princípios que ela estabelece. A lei consolida, sistematiza e moderniza a relação contratual do seguro, trazendo mais transparência e equilíbrio contratual, o que ajuda, inclusive, a reduzir a judicialização, a partir de um entendimento mais claro entre segurados e seguradoras sobre o objeto do contrato.”

Marcos Falcão enfatizou a importância da lei para o crescimento do mercado. Segundo ele, “a nova lei é essencial para que o mercado de seguros possa se expandir, pois garante que o segurado tenha o pagamento de sinistro de forma rápida, simples e bem regulada.”

Já o advogado Ernesto Tzirulnik, autor da Lei dos Seguros, relembrou o contexto histórico do setor: o Brasil viveu décadas com um ressegurador monopolista que comprava retrocessões do mercado internacional, permitindo o desenvolvimento de boas práticas. “O ressegurador tinha poder como comprador. Imagine ser um segurado que compra 80%, 90% ou até 100% do mercado brasileiro ou fornece o que ele adquire. Essa posição possibilitou a criação de boas práticas. Claro que, como todo mercado, havia imperfeições, mas trouxe conquistas importantes. Nunca houve, no Brasil, a difusão do contrato de seguro pela simples falta de aceitação”, comentou.

Tzirulnik destacou, ainda, que, a partir de 1985, com a promessa de abertura do resseguro, o mercado entrou em um processo arriscado, permitindo a entrada de resseguradoras externas que não estavam sujeitas aos mesmos controles e supervisão. “Tivemos uma grande deformação”, disse. O presidente do IBDS alertou para os receios atuais com a nova Lei: “Há medo de uma mudança tão radical que o ‘ídolo’ que antes era obrigado a aceitar todos os riscos deixe de existir. Se tivéssemos apenas o artigo primeiro da Lei de Contrato de Seguro, já estaríamos bem. Mas o formalismo excessivo anterior gerava litigiosidade em larga escala.”

O CEO da Mapfre, Felipe Nascimento, destacou três pontos principais como desafios da nova lei: o risco a ser coberto, a documentação e o conhecimento do corretor de seguros. “Antes, o segurado tinha a obrigação de fornecer informações sobre o risco coberto; agora, essa responsabilidade passa a ser da seguradora. Outro ponto é que, quando for necessário limitar a cobertura, precisaremos ser mais explícitos sobre como ela se aplica, com documentação adequada para regular o novo sinistro, considerando prazos mais exigentes”, argumentou.

O executivo lembrou que é preciso saber quais tipos de documentos são exigidos para cada ocorrência, pois os sinistros têm natureza aleatória. “Para isso, a Lei prevê dois momentos em que é possível solicitar documentação adicional, e a contagem dos prazos também apresenta especificidades”, explicou. Além disso, segundo Nascimento, o corretor de seguros precisa ter sua posição fortalecida, atuando como extensão do cliente. Essa interação precisa ser muito fluida, especialmente em um cenário em que o segurador passa a ter exigências maiores”.

O CEO do IRB(Re), Marcos Falcão, acrescentou outros pontos importantes, como a clareza na comunicação, ao concordar com Nascimento quanto à relevância dos corretores. “É essencial que os contratos sejam claros e bem comunicados. O profissional deve ajudar a traduzir o contrato para o cliente e trabalhar conosco no feedback dessas apólices.”

Outro desafio citado pelo moderador Christian Mendonça refere-se à contratação de seguros de diferentes níveis e tamanhos. Há receio de que grandes riscos enfrentem dificuldades na colocação de seus produtos particulares e especiais. “A nova lei não é minuciosa nem intervém profundamente nas relações contratuais, seja vertical ou horizontalmente. Ela estabelece regras gerais para qualquer contrato de seguro”, afirmou. 

Para Mendonça, com base na experiência com grandes riscos, não existe paridade completa entre segurados e seguradoras na negociação das apólices. “Há espaço para algumas intervenções ou ajustes, mas isso não altera a essência do contrato de seguro negociado”, complementou.


Instituições do Setor: Papel e Perspectivas do Mercado de Seguros frente ao Marco Legal


Sob a mediação do presidente da ABGR, Luiz Otavio Artilheiro, participaram deste painel o superintendente da Superintendência de Seguros Privados (Susep), Alessandro Octaviani, o presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), Dyogo Oliveira, a presidente da Federação Nacional das Empresas de Resseguros (Fenaber) e Lloyd’s Brasil, Rafaela Barreda, e o vice-presidente da Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor) e coordenador do Comitê de Open Insurance, Manuel Matos.

Para o superintendente da Susep, Alessandro Octaviani, o mercado de seguros desempenha um papel crucial no dia a dia da sociedade. “No Rio Grande do Sul, apenas 6% da população compreende adequadamente a importância da contratação de seguro. Essa lacuna securitária nos leva a pensar em como podemos ampliar o mercado. Esse é, de fato, o grande objetivo da lei que estamos debatendo”, alertou.

Octaviani destacou que a arquitetura geral da lei busca trazer maior segurança e clareza, com condições de interpretação mais diretas e algumas inovações estruturais. “Estamos falando das chamadas garantias institucionais. Do ponto de vista jurídico, isso significa que não é necessário, a cada passo da relação contratual, buscar o que está regulamentado em cada manifestação específica. O legislador optou por criar certezas, ao reunir os grandes comandos da relação em um único diploma legal. Diferentemente da Lei de Sociedades Anônimas, agora a Lei de Contrato de Seguro prevê um regime de garantias institucionais globais, colocando nosso mercado no mesmo patamar dos principais mercados mundiais”, justificou.

Ele também ressaltou a importância da regulamentação administrativa, citando a votação no Conselho Diretor da Susep sobre a primeira norma referente à Lei 213, que regula a atividade das associações de proteção patrimonial. “Queremos que essas normas sejam enviadas à consulta pública, recebam contribuições de diversos atores e sejam implementadas ao longo do semestre, assim como ocorreu com a Lei 15.040. A lei foi fruto de amplo diálogo, e a regulamentação deve seguir o mesmo princípio, pois é assim que se constrói um mercado sólido e de longo prazo.”

O presidente da CNseg, Dyogo Oliveira, trouxe a perspectiva das seguradoras sobre o impacto da lei na gestão de riscos. “O novo Marco Legal é, em grande parte, autoaplicável. O único artigo que exige regulamentação direta trata do prazo de 120 dias para casos específicos. No geral, a lei organiza e consolida as principais práticas do mercado segurador”.

Quanto aos grandes riscos, Oliveira destacou que a Lei 15.040 introduz algumas novidades que exigirão maior segmentação. “Um ponto relevante é o processo de aceitação por negativa. A seguradora, ao receber uma proposta, terá um prazo definido para negá-la, com um processo estruturado de recepção da proposta. Outro ponto importante é a regulação de sinistros, com troca contínua de informações entre segurado e seguradora, promovendo cooperação permanente.”

A presidente da Fenaber, Rafaela Barreda, por outro lado, afirmou que o mercado passa por um momento de adaptação. “A lei é clara quanto às obrigações de todos os participantes — seguradoras, prestadores de serviços, corretores e segurados. Precisamos garantir que o mercado segurador e ressegurador se mantenha resiliente e preparado para o futuro, continuando a oferecer as garantias que já oferece.”

Na ocasião, ela também enfatizou a importância do conhecimento e da comunicação, especialmente em face dos grandes riscos. “É fundamental que o segurado explique o risco à seguradora, assim como a seguradora esclareça suas necessidades ao ressegurador. Com a entrada em vigor da Lei em dezembro, todos os participantes devem se adaptar para estarem preparados já em 11 de dezembro”, ressaltou Rafaela.

O vice-presidente da Fenacor, Manuel Matos, comentou sobre a importância da persistência e da luta de mais de 20 anos do advogado Ernesto Tzirulnik. “O setor de seguros vive um momento de transformação, não apenas pela lei que redesenha o contrato de seguro, mas também pelas leis complementares, que introduzem novos atores e inovações ainda pouco percebidas pela sociedade.” Na visão de Matos, o novo Marco Legal é imprescindível para todos os entes do mercado segurador e ressegurador.

                                                             

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