Rol taxativo ou exemplificativo: consequências para o mercado de saúde
24, Fev. 2022
STJ suspende novamente, por até 90 dias, o julgamento do rol
taxativo ou exemplificativo, após novo pedido de vista do processo.
Por Kelly Lubiato Fonte:
Revista Apólice
EXCLUSIVO – O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julga recursos que podem restringir a cobertura de planos de saúde. O ministro do STJ Luis Felipe Salomão, relator do caso, em julgamento da 4.ª turma em 2019, votou a favor do rol taxativo, argumentando que considerá-lo exemplificativo restringiria a livre concorrência das operadoras de planos de saúde e dificultaria “o acesso à saúde suplementar às camadas mais necessitadas e vulneráveis da população”. Esta visão, entretanto, preocupa grupos de pacientes e familiares de crianças com deficiência, que temem a interrupção de tratamentos concedidos por via judicial.
De acordo com informações da Estadão Conteúdo, somente em
2019 ocorreram 112.253 demandas judiciais de direito do consumidor envolvendo
planos de saúde. O Brasil possui atualmente cerca de 49 milhões de
beneficiários em planos de assistência médica e odontológica.
A advogada e professora Angélica Carlini é especialista em
Direito do Seguro, do Consumidor e na área de Saúde. Ela classificou o impacto
desta decisão como “catastrófico”, porque “se o julgamento entender que o rol é
exemplificativo, como serão feitos os cálculos atuariais para formação dos
fundos mutuais que sustentam os contratos?, questiona. A sustentabilidade do
sistema fica em risco.
Por outro lado, o rol taxativo tem a vantagem de sustentar o
sistema. “Se ele for exemplificativo a única a alternativa para as operadoras
será construir planos pós-pagos para cada grupo, o que pode se transformar em
uma pequena tragédia, porque não há fundo mutual que dê conta de sustentá-lo”,
avalia a advogada.
A função da ANS é construir este rol dentro das melhores evidências
científicas para que, de fato, se tenha segurança, para que não passe nada que
possa ser prejudicial para o contratante. A ciência ficou muito complexa e as
informações são disseminadas, mas nem sempre significam conhecimento.
Angélica Carlini
O julgamento deve definir se a lista de procedimentos e
remédios coberta pelos planos, estabelecido pela Agência Nacional de Saúde
Suplementar é exemplificativo ou taxativo. As operadoras de saúde afirmam que
precisam da segurança jurídica para viabilizar financeiramente a manutenção do
serviço. O adiamento ocorreu após pedido de vista (mais tempo para analisar o
tema). Apenas dois dos nove ministros apresentaram seus votos: o relator Luis
Felipe Salomão, a favor da taxativa, e Nancy Andrighi, a favor da exemplificativa.
Uma nova sessão deve ocorrer em até 90 dias.
Me preocupa um setor que todos querem contratar, mas que
ninguém quer defender. Esta medida pode significar um retrocesso, pois pode
inviabilizar a contratação de planos de saúde para pessoas de menor poder
aquisitivo.
Angélica Carlini
Segundo nota divulgada pela Unimed do Brasil, a legislação
dos planos de saúde já estabelece o poder da ANS para editar e atualizar o rol,
em ciclos contínuos que permitem a incorporação de novas tecnologias em até 180
dias. Atualmente, os planos de saúde já garantem a cobertura de quase 3,4 mil
procedimentos e eventos em saúde, incluindo terapias especializadas de alto
custo e medicamentos orais para tratamento do câncer. O julgamento não
significará a restrição de coberturas nem retirará a obrigação das operadoras
de cobrir todo o rol e suas futuras atualizações.
Unimed do Brasil
Em nota, a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar
reforça o que diz a advogada sobre a viabilidade financeira dos planos em caso
de rol exemplificativo: “além da falta de padronização das coberturas, o
caráter exemplificativo do rol – por não conferir previsibilidade quanto aos
procedimentos e eventos que podem vir a ser utilizados – tenderia a elevar os
valores cobrados pelas operadoras aos seus beneficiários, como forma de manter
a sustentabilidade de suas carteiras”.
O caráter taxativo do rol confere a prerrogativa da ANS de estabelecer as coberturas obrigatórias a serem ofertadas pelos planos de saúde, sem que os consumidores precisem arcar com custos de coberturas adicionais. Assumir que o rol seja meramente exemplificativo significa, no limite, atribuir a cada um dos juízes do Brasil a prerrogativa de determinar a inclusão de cobertura não prevista em contrato ou no rol de cobertura mínima, o que traria o aumento da judicialização no setor de saúde e enorme insegurança ao setor de saúde suplementar, na medida em que seria impossível mensurar adequadamente quais os riscos estariam efetivamente cobertos. O que impacta na definição do preço dos produtos.
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