PIB cresce 4,6% em 2021, recupera perdas da pandemia em 2020, mas guerra piora perspectiva para 2022
04, Mar. 2022
Economia cresceu 0,5% no quarto trimestre do ano passado
ante o terceiro
Por Daniela Amorim e Vinicius Neder,
Fonte: O Estado de S.Paulo
RIO- A economia do Brasil terminou 2021 confirmando a
recuperação completa das perdas registradas com a pandemia de covid-19 em 2020,
mas o ritmo lento da atividade no quarto trimestre e, agora, a guerra na
Ucrânia, lançam dúvidas sobre o desempenho deste ano, que pode passar de uma
esperada estagnação para uma retração. Com alta de 0,5% no quarto trimestre
ante o terceiro, o Produto Interno Bruto (PIB, a soma de todo o valor gerado na
economia) cresceu 4,6% no ano passado, ante queda de 3,9% em 2020, informou
nesta sexta-feira, 4, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Na prática, após atingir o fundo do poço no segundo
trimestre de 2020, auge da pandemia, a economia se recuperou entre o terceiro
trimestre daquele ano e o primeiro de 2021. O desempenho dos três primeiros
meses garantiu o avanço do ano passado. Nas palavras da economista Alessandra
Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, após voltar ao nível pré-pandemia, a
economia “ficou de lado”.
O economista-chefe do banco Original, Marco Caruso,
descreveu o desempenho do biênio 2020 e 2021 como “um grande zero a zero”. “Os
4,6% (de crescimento em 2021) nos devolvem para níveis pré-pandemia e mostram o
quanto 2022 será um ano complicado”, disse o economista.
A recuperação do fim de 2020 a 2021 se deu de forma
heterogênea, assim como foi heterogênea a forma como a pandemia desorganizou a
economia, favorecendo alguns setores e prejudicando outros. Indústria e
agropecuária saíram na frente na retomada, enquanto o setor de serviços, que
responde por cerca de 70% da economia e é o mais afetado pelas restrições ao
contato social, demorou mais para pegar o ritmo.
Só que o desempenho da indústria foi perdendo fôlego ao
longo dos trimestres, por causa da demanda pouco firme e do travamento das
cadeias globais de produção, que, desde 2020, vem causando escassez e
encarecimento de componentes – a falta de semicondutores para a fabricação de
automóveis é um dos ícones do problema. Já o crescimento dos serviços foi
ganhando ritmo à medida que o avanço da vacinação contra covid-19 foi permitindo
a volta ao “normal” de uma série de atividades, com o relaxamento de medidas de
restrição ao contato social.
Serviços,agropecuária e indústria
Por causa dessa heterogeneidade e dos ritmos distintos, no
quarto trimestre, os serviços cresceram 0,5% ante o terceiro trimestre,
enquanto a agropecuária avançou 5,8% e a indústria recuou 1,2%. No agregado de
2021, houve crescimento de 4,7% nos serviços e de 4,5% na indústria. Afetada
por problemas climáticos, com a estiagem e as geadas, a agropecuária encolheu
em 0,2% ante 2020.
A reabertura da economia ao longo de 2021 também permitiu
uma relativa melhora do mercado de trabalho, que já emprega número recorde de
pessoas, embora com salários mais baixos – a renda média do trabalho terminou o
ano passado no menor valor da série histórica do IBGE, iniciada em 2012.
Essa relativa melhora no mercado de trabalho, além dos
pagamentos de novas rodadas do Auxílio Emergencial, ainda que com valores
menores do que em 2020, impulsionou o consumo das famílias, principal
componente do PIB pelo lado da demanda. O consumo cresceu 0,7% no quarto
trimestre e fechou 2021 com avanço de 3,6%. Ainda pela ótica da demanda, a
formação bruta de capital fixo (FBCF, a medida dos investimentos no PIB)
avançou 0,4% no trimestre e 17,2% no ano.
“No início, houve uma recuperação sem empregos. Depois, o
PIB andou de lado, mas com uma composição mais favorável aos empregos, ainda
que abrindo vagas informais e que pagam pouco”, afirmou Bráulio Borges,
economista sênior da LCA Consultores, ressaltando que a recuperação do nível de
atividade econômica ao patamar anterior à pandemia não pode ser definida como
um resultado positivo, já que, antes da covid-19, esperava-se crescimento em
2020 e 2021.
Agora, segundo
economistas, esse processo de “normalização” está praticamente esgotado,
faltando apenas alguma recuperação nos serviços mais afetados pelo isolamento
social, como bares, restaurantes, hotéis e atividades de lazer. O problema é
que, já no fim do ano passado, economistas alertavam que, terminada a
“normalização”, há poucos motores para impulsionar a economia.
A inflação elevada – turbinada por choques de oferta de
alimentos, energia e combustíveis, pelo encarecimento de matérias-primas e pela
alta do dólar, que só passou a dar alívio neste início de 2022 – minou ainda
mais o rendimento das famílias, segurando o consumo, ao mesmo tempo em que
levou o Banco Central (BC) a elevar os juros básicos, esfriando uma demanda já
não muito aquecida.
“O crédito mais caro, o ambiente de instabilidade e o
comportamento dos indicadores de confiança não nos deixam ser muito otimistas
com 2022”, afirmou o economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani.
Para Caruso, do banco Original, o ano não começou “tão bem,
com a pandemia voltando a piorar temporariamente e a guerra no exterior”. A
guerra na Ucrânia tende a agravar o quadro. Novas rodadas de valorização de
matérias-primas, como o petróleo, pressionarão ainda mais a inflação, levando o
BC a manter os juros elevados por mais tempo, ou, até mesmo, ir mais longe nos
aumentos. O alívio nas cotações do dólar neste início de ano, que “ajudaria
muito no processo de desinflação”, nas palavras de Alessandra Ribeiro, pode
acabar apenas evitando uma nova escalada muito forte da inflação.
“Ainda não mudamos
nenhum número (de projeção) por causa da guerra, porque depende muito da
duração. Quanto mais prolongado o conflito, maiores os efeitos. Se for mais
prolongado, haverá um efeito adicional na inflação, mas é um cenário econômico
pior em relação ao que tínhamos previamente, que já não era muito bom”, afirmou
a economista da Tendências.
(Colaboraram Cícero Cotrim e Marianna Gualter)
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