Entenda o que é compliance e como as empresas podem se beneficiar dos investimentos nessa área
14, Abr. 2022
Especialistas apontam que bons programas de compliance
fortalecem a governança corporativa, protegem a perenidade dos negócios e
atraem investidores
Por:Heloísa Scognamiglio, Fonte: O Estado de S. Paulo
O termo “compliance” vem do verbo inglês “to comply”, que
quer dizer estar de acordo ou em conformidade, seja com leis, regulamentações
ou políticas internas, por exemplo. No mundo dos negócios, o compliance tem uma
enorme importância e se refere às medidas que as empresas implementam com o
objetivo de mitigar riscos e aumentar a segurança de seus processos, sendo um pilar
para a governança corporativa.
“Em linhas gerais, compliance poderia significar
simplesmente estar de acordo com leis ou regulamentações aplicáveis àquela
empresa, mas essa visão é geral demais”, afirma Raphael Soré, sócio de
Compliance da KPMG no Brasil. “Quando falamos em programa de compliance, nos referimos
às medidas que uma empresa implementa para mitigar riscos de compliance. Esses
riscos podem incluir os riscos regulatórios, tributários, trabalhistas,
concorrenciais e reputacionais, mas são principalmente os riscos de integridade
do negócio, relacionados a fraude, corrupção e criminalidade corporativa”, diz.
Jefferson Kiyohara, diretor de Compliance &
Sustentabilidade na ICTS Protiviti e professor da FIA, acrescenta que o
programa de compliance foi criado para auxiliar na criação de uma cultura
corporativa de integridade. “O compliance, de um modo geral, serve para
proteger a reputação de uma empresa e garantir sua perenidade. Quanto custaria
para uma empresa ser envolvida em um escândalo? As empresas podem perder muito
dinheiro e ter impacto na imagem. É mais barato e eficiente agir de forma
preventiva e por isso o compliance não deve ser considerado um custo, mas sim um
investimento.”
Crescimento
O compliance vem ganhando cada vez mais relevância entre as
empresas brasileiras nos últimos anos. A Lei 12.846, conhecida como Lei
Anticorrupção, que entrou em vigor em 2014, aumentou o debate acerca do tema e
fez com que empresas corressem para investir em áreas de compliance. No
primeiro momento, no entanto, os programas não eram efetivos.
“Várias empresas acabaram por implementar aquilo que
chamamos de ‘programa de papel’, que é somente formal e não funciona. Mas, com
o tempo, temos visto evolução das empresas brasileiras e uma maior maturidade
desses programas. Nos últimos anos, há um efetivo aumento do investimento das
empresas brasileiras em construir e reformar os seus programas de compliance
para que eles fiquem mais eficientes”, diz Soré, da KPMG.
O movimento das empresas não ocorre de modo igual em todo o
mercado, segundo Soré, sendo visto primeiro em empresas maiores, especialmente
as que têm negócios nos Estados Unidos, onde a legislação é mais rigorosa. Com
isso, porém, outras empresas, grandes, médias ou pequenas, também precisaram
evoluir.
“É o ciclo virtuoso do compliance. Empresas que têm
programas de compliance robustos começam a olhar com lupa quem são as empresas
com quem elas fazem negócios, fiscalizando como esses possíveis parceiros lidam
com seus programas de compliance, para que não sejam responsabilizadas ou
afetadas por algo de errado que esses terceiros façam. É o 'know your supplier',
conheça seu fornecedor, que também ajuda a impulsionar a evolução do compliance
no mercado”, afirma Soré.
Segundo os especialistas, durante a pandemia do novo
coronavírus, novos riscos surgiram com o trabalho remoto, como a maior
dificuldade de conduzir investigações internas e treinamentos, além das
questões de cibersegurança. Isso também fez com que os programas de compliance
tivessem que ser adaptados e fortalecidos para fazer frente a esses novos
riscos.
Implementação
Para que seja implementado um programa de compliance eficaz
em uma empresa, é preciso, em um primeiro momento, conhecer a complexidade do
negócio. Uma padaria com poucos funcionários, por exemplo, não precisa ter um
compliance officer (profissional responsável pelo compliance), mas pode ter um
código de conduta que fique à vista dos funcionários e pode disponibilizar uma
caixinha de denúncias. Já empresas maiores e mais complexas precisam de
estruturas mais robustas.
Outro passo inicial é o mapeamento dos riscos, para que sejam
determinados a quais riscos a empresa está exposta e como eles devem ser
mitigados. “E quando falamos em risco, estamos falando de um risco que pode
efetivamente atrapalhar a continuidade do negócio. Casos de discriminação
racial, de corrupção, de assédio sexual, por exemplo, podem afetar a imagem da
empresa e também ter um impacto financeiro. Há empresas que realmente foram à
falência por conta de problemas de compliance, outras tiveram que mudar de
nome”, diz Soré.
Os programas de compliance se baseiam em três pilares: a
prevenção, a detecção e a resposta.
Prevenção: Estabelecimento de códigos de conduta,
políticas internas e procedimentos, além da condução de treinamentos para que
funcionários e terceiros conheçam e entendam as normas e o que a empresa espera
deles.
Detecção: O programa de compliance precisa ter
instrumentos para diagnosticar rapidamente se algo de errado está acontecendo.
O canal de denúncia é considerado muito importante para a detecção, já que é um
mecanismo por meio do qual a empresa recebe avisos quando as pessoas enxergam o
descumprimento de alguma regra, por exemplo. Sua existência também auxilia na prevenção,
já que pode inibir atos que ferem os princípios da empresa. Outros instrumentos
de detecção são as auditorias internas e outros sistemas que hoje já usam a
inteligência artificial para verificar riscos.
Resposta: Quando é detectado algo fora do comum, é
preciso que a empresa dê consequência àquilo que foi diagnosticado. É preciso
haver procedimentos estabelecidos para a investigação interna e, se for o caso,
a punição ou reeducação de um funcionário ou terceiro, garantindo a mitigação
do risco de que aquilo volte a ocorrer.
Em empresas mais complexas, o recomendado é haver um
departamento dedicado ao programa de compliance, que disponha de adequada
independência da administração para poder aplicar o programa. A área deve ser
responsável por implementar todos os processos, entender os riscos da empresa,
escrever e revisar as políticas, conduzir treinamentos, realizar investigações
e aplicar medidas disciplinares. Jefferson Kiyohara, da ICTS Protiviti, destaca
a importância também do profissional de compliance.
“Percebemos que, no mundo corporativo, muita gente ainda nem
sabe qual a função do profissional de compliance. Há o debate sobre como
combater o assédio sexual e moral, o racismo, a corrupção nas empresas, por
exemplo, sem envolver o profissional de compliance. E há a procura por outros profissionais.
Mas é o profissional de compliance que estuda isso e é especializado nisso e,
por isso, deve ser incluído”, aponta.
Outro ponto importante do compliance é o apoio da alta
gestão. É imprescindível que a diretoria e o conselho de administração
demonstrem a importância do compliance, tanto por meio de declarações, como de
ações, criando mecanismos independentes para o programa de compliance,
investindo na área, contratando pessoas especializadas e aplicando medidas
disciplinares quando elas têm que ser aplicadas.
Benefícios
Segundo os especialistas, os principais benefícios trazidos
por um bom sistema de compliance são:
Proteção da empresa, garantindo a continuidade dos negócios,
por meio da identificação e mitigação de riscos;
Prevenção de danos reputacionais e financeiros;
Contribuição para o fortalecimento da governança
corporativa, com a criação de uma cultura corporativa íntegra e baseada na
ética;
Garantia de melhores parceiros de negócios, por meio da
fiscalização de fornecedores e outros terceiros;
Transparência e clareza para stakeholders (todas as partes
interessadas na empresa, incluindo funcionários, acionistas, clientes e
comunidade), demonstrando que a empresa segue leis e regulamentações;
Atração de investidores, por meio da demonstração de que a empresa tem credibilidade e os negócios são sólidos.
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