Sob influência do Centrão, Susep freia inovações que poderiam baratear seguros
13, Jun. 2022
Fonte: CQCS
Troca no comando da superintendência desacelerou discussões
para implementar o Open Insurance, que reduziria em até 50% o seguro do carro
Em sua posse na presidência da Federação Nacional dos
Corretores de Seguros Privados (Fenacor), há duas semanas, Armando Vergílio
defendeu “urgentemente” correções para “desconstruir grandes maldades
praticadas nos últimos dois ou três anos contra todo o setor e nós, os
corretores”.
Ele se referia à atuação da ex-xerife do mercado de seguros
Solange Vieira, substituída em novembro de 2021 no comando da Superintendência
de Seguros Privados (Susep) por Alexandre Camillo. O novo superintendente vem
do setor de corretagem — foi diretor da Fenacor — e acompanhou a posse de
Vergílio ao lado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e de outros
parlamentares do Centrão. A indicação de Camillo é atribuída ao grupo político
que se tornou base do governo Bolsonaro e retomou a influência que havia
perdido na autarquia.
A troca de comando na Susep freou uma agenda de inovações
que prometia uma revolução no setor, alterando os rumos da regulação.
Solange havia sido indicada para a Susep em 2019 pelo
ministro da Economia, Paulo Guedes, para pautar uma linha liberalizante de
desburocratização e ampliação da concorrência no setor. As principais apostas
dela foram o sandbox (modelo de flexibilização de regras que permite inovações
de pequenas empresas, como start-ups financeiras) e o Open Insurance
(equivalente ao Open Banking no mercado financeiro, que consiste no
compartilhamento de dados dos clientes para aumentar a concorrência).
As iniciativas eram vistas como uma oportunidade de
proporcionar seguros mais modernos, personalizados e baratos, mas a nova
direção da Susep desacelerou as mudanças, como queriam corretores e grandes
seguradoras.
Camillo diz fazer revisão
Previsto inicialmente para entrar em operação no fim deste ano, a implementação do Open Insurance foi adiada para meados de 2023. Nos corredores da Susep é dado como certa uma nova extensão do prazo porque todo o processo esfriou na nova diretoria.
Estimativas da Susep apontavam que o preço do seguro de
automóveis, por exemplo, poderia cair entre 30% e 50% com o novo sistema de
compartilhamento de informações. Mas, sem os avanços, segue em alta. O valor
médio dos contratos para carros subiu 32% nos últimos 12 meses, segundo o IPCA
de maio, bem acima da inflação no período, de 11,73%.
As mudanças na regulação que estavam em curso na Susep eram
muito criticadas pelas entidades que representam seguradoras e corretores, de
onde vem Camillo. O setor resiste às alterações, entre outros fatores, porque o
novo sistema exige um grande investimento em tecnologia e na proteção de dados
ao mesmo tempo em que aumentam as possibilidades de venda direta de seguros,
com os clientes contratando em plataformas digitais sem a intermediação dos
corretores.
Desde que assumiu a Susep, Camillo preferiu se concentrar na
defesa da manutenção do DPVAT, o seguro obrigatório de danos pessoais para
veículos, que está em estudo no governo, e da autorregulação do setor, deixando
o Open Insurance em segundo plano. Ao GLOBO, o atual superintendente da Susep
disse que está “revisitando” as normas para ter um arcabouço jurídico
“perfeito”. Questionado sobre o impacto do adiamento para os consumidores,
Camillo afirmou que prefere levar a coisa de forma não “açodada”:
— O consumidor precisa de algo que leve a ele segurança,
ainda mais quando se trata de expor seus dados.
Volta do DPVAT
A visão é compartilhada por Dyogo Oliveira, presidente da
Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg). A entidade enviou pedido à Susep
recentemente para adiar o Open Insurance para o fim de 2023 e diminuir o escopo
dos dados compartilhados pelas seguradoras. Mas Gesner de Oliveira, coordenador
de pesquisa do Instituto de Inovação em Seguros e Resseguros (IISR) da FGV,
avalia que o adiamento prejudica o consumidor:
— São reformas que devem ser feitas com todo o cuidado, mas
quanto mais adiadas mais desprotegida fica a população.
Camillo explica por que considera prioritário repensar o
DPVAT em vez de acelerar o Open Insurance:
— A gente acredita que ainda tenha fundos (do DPVAT, sem
cobrar prêmio dos donos de veículos) para um período do ano que vem, o que não
é satisfatório, pois não pode ter um atendimento para um exercício quebrado.
O DPVAT obrigatório é de interesse das seguradoras e
historicamente é ligado a Luciano Bivar, presidente do União Brasil e
pré-candidato à Presidência, que tem negócios no setor. O governo está revendo
o seguro, que já foi alvo de irregularidades no passado, quando era
administrado por empresas. Hoje a gestão está com a Caixa. O governo não cobrou
o prêmio do seguro dos proprietários de veículos nos últimos dois anos por
sobra de recursos do DPVAT.
Camillo, que teve o apoio do Centrão e do Planalto para assumir a Susep, tem sua indicação atribuída nos bastidores do governo ao advogado Antônio Rueda, próximo a Bivar. No entanto, Rueda nega ter feito qualquer indicação em qualquer governo. Diz conhecer o atual superintendente, mas não ter relação com ele.
O novo líder da Susep é próximo a Lira, que fez questão de
demonstrar apoio aos corretores no evento da Fenacor:
— A Câmara sempre estará de portas abertas para o setor. No
caso do pleito da autorregulação, nossa vinda aqui é para prestigiar vocês.
Sintam-se em casa no meu gabinete.
A gestão de Solange Vieira desagradou porque ela “não
dialogava” muito com seguradoras e corretores, dizem representantes do setor. A
principal crítica era sobre prazos apertados para cumprir muitas regras novas e
compartilhar dados para acelerar a abertura do mercado. Executivos do setor
dizem que a interlocução com Camillo é melhor.
Solange também havia interrompido a histórica influência dos
partidos do Centrão na Susep. Com a aproximação de Bolsonaro destas legendas,
Paulo Guedes não conseguiu mantê-la. Funcionária de carreira do BNDES, Solange
voltou ao banco para assumir uma diretoria. Procurada, não quis se manifestar.
Impacto só em 2024
Apesar do recuo da Susep, empresas que inovam no setor
comemoram o pouco já feito. Segundo o CEO da Pier Seguradora, Igor Mascarenhas,
a start-up conseguiu, em quatro anos, acumular uma base de 120 mil clientes,
sendo que 60% não tinham seguro antes:
— O mercado de seguros tem potencial enorme, no Brasil
equivale a só 4% do PIB (Produto Interno Bruto), contra 7% em países
semelhantes.
A advogada Camila Calais, sócia do escritório Mattos Filho
com foco no setor, vê benefícios no Open Insurance, como mais agilidade e
opções de escolha para os clientes, mas ressalta que o mercado ainda enfrentará
desafios como equalizar os prazos e investimentos necessários.
Na visão dos executivos do mercado, o Open Insurance ainda
deve demorar anos para ter um impacto significativo. De acordo com pesquisa
feita pela consultoria Capgemini, obtida com exclusividade pelo GLOBO, a maior
parte dos executivos espera que o Open Insurance passe a impactar o mercado só
em 2024.
— Um desafio claro é de conhecimento. A gente fez essa
pergunta para as empresas, sobre qual o grau de conhecimento que elas têm em
relação ao Open Insurance, e é muito baixo — diz Francisco Galiza, consultor e
parceiro da Capgemini na elaboração do estudo, que prevê uma adaptação em longo
prazo.
De acordo com a pesquisa, o Open Insurance deve levar à
entrada de novas empresas e novos produtos no mercado, além de uma distribuição
mais diversificada e a manutenção dos lucros do setor, mas não necessariamente
a preços mais baixos. O vice-presidente para Serviços Financeiros da Capgemini
Brasil, Roberto Ciccone, concorda que as mudanças na regulação aumentam a
competitividade, mas ressalta que o preço também depende de outros fatores.
Entenda algumas mudanças em curso:
Open Insurance
Uma das apostas da Susep (órgão do governo que regula o mercado de seguros), o Open Insurance prevê o compartilhamento de dados entre seguradoras para que possam oferecer produtos sob medida e com melhores condições aos consumidores, acirrando a concorrência. É um modelo similar ao do Open Banking, que o Banco Central implementa no setor financeiro.
Sandbox
Para fomentar as insuretechs, como são chamadas as start-ups
de seguros, a Susep adotou o modelo de sandbox: a regulação é flexibilizada
para a experimentação de novos modelos e produtos propostos pelo mercado, sem
formatação prévia.
Novas possibilidades
Entre os novos modelos de seguros viabilizados neste novo
ambiente estão os que podem ser contratados via aplicativos e o “liga e
desliga”, como o de carro ou residencial que o usuário ativa quando sai de casa
ou paga de acordo com quilômetros rodados, no caso de veículos.
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Revista Insurance Corp: http://insurancecorp.com.br/pt/content/pdf/ic_ed41_2022.pdf
Revista Segurador Brasil:
Revista Seguro Total: https://revistasegurototal.com.br/2022/04/20/edicao-225-2022-a-volta-dos-encontros-presenciais/
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Conjuntura CNseg :
Revista Insurtalks: